Poucos
dias atrás, ao assistir uma reportagem sobre um pai de família que
esperou por treze longos anos por uma oportunidade de ver a justiça,
de acordo com o seu ponto de vista, prevalecer sobre o acusado de ter
matado seu filho, e quando finalmente ela chegou, ele não a deixou
escapar. Acreditava que ele mesmo deveria fazer a sua justiça com as
próprias mãos e matou a pessoa que outrora havia tirado a vida de
seu filho. Um ato de pura injustiça para justificar um outro. Depois
desse triste episódio e arrependido o velho pai, justo aos seus
olhos, foi condenado a alguns anos de prisão em regime semi aberto.
Durante esse período o seu coração clamou por uma justiça que se
confundia com vingança. Fiquei refletindo na dor desse pai. Um homem
aparentemente justo, integro e reto e que queria justiça a qualquer
preço, comete um ato de injustiça perante a sociedade.
Talvez
para si e para muitas pessoas que acompanharam o caso, ele fez a
justiça. Mas fiquei pensando na sua integridade. Ele agora pelo
resto de sua vida terá de conviver com o fantasma de ser um
assassino. Se a sua família já estava destruturada e fortemente
abalada com a dor da perda de um ente querido, quanto mais agora, com
a sua prisão, e com esse estigma que pesará sobre seus ombros.
Assassino. Como já disse, nada justifica um ato de injustiça.
Talvez seja esse o motivo do seu arrependimento. Como se pode esperar
de que nós, seres humanos injustos, cometam atos de justiça? Isso é
contrário a natureza humana. É o mesmo que esperar que um pé de
abacate produza laranja, ou de um pé de melancia que produza
abacaxi. Impossível. Percebi que o nosso clamor por justiça é,
muitas vezes, na realidade por vingança. Há um adágio que diz que
a Deus pertence a vingança. Engana-se quem pensa assim. Deus não é
vingativo, Ele é justo e misericordioso. Esse sentimento Ele não
tem. A sua natureza é intrinsícamente amor. E o objeto de seu amor
somos nós, homens injustos. Que sua misericórdia triunfe sobre a
nossa justiça.
Infelizmente
são dois sentimentos, um positivo e um negativo, que nos acompanham
bem de perto. Por um, o sentimento de justiça, eu clamo a pleno
pulmões quando quero que seja feita a meu favor. O outro, o de
vingança, eu escondo dentro do meu peito e muitas vezes confesso,
também a plenos pulmões, que não possuo tal sentimento. Esse não
é um sentimento nobre, digno do ser humano, mas o fato é que ele
está dentro de nós ao passo que o outro, o de justiça, um
sentimento nobre, mas está fora de nós. Eu clamo por um, mas,
realizo o outro. O que parece ser justo para mim, pode não parecer
para outrem. Por sermos injustos, cometemos tantas barbáries
impossíveis de acreditar que foi um ser humano que cometeu. Diante
disso clamamos por uma justiça mesclada com vingança. Não há um
justo sequer. Aliás, só sei de apenas um homem que era justo e
ainda assim foi morto injustamente. O justo morreu pelos injustos,
foi pregado em uma cruz injusta, por mãos injustas, para
justificar-nos das nossas injustiças. É Deus quem nos justifica.
Ainda
bem que Deus não nos pois por juiz de ninguém, caso contrário, ao
clamor da justiça, cometeríamos vingança. Cerca de trinta dias
atrás, assistimos pasmos diante dos nossos televisores, o julgamento
de um casal, cujo pai e a madrasta, conjuntamente assassinaram uma
menina de seis anos. A população saiu às ruas sob forte clamor de
justiça. Notava-se claramente nos rostos e nos depoimentos que além
da justiça, que só tinha um lado, a condenação, por trás de cada
palavra, se escondia a chama do ódio e da vingança por tal atitude
brutal. Os réus e seus familiares esperavam que a justiça
prevalecesse e que a verdade viesse à tona. A mãe da vítima e a
população também ansiava pelo mesmo sentimento de justiça. Se
houvesse justiça em favor de um lado, o outro não aceitaria e caso
contrário também. Se esse casal tivesse sido absolvido, será que a
justiça não teria sido realizada pelos jurados? A justiça não é
parcial. Somente Deus é justo. A nossa justiça é como trapos de
imundícia. Com as mãos que mataram o justo, queremos fazer justiça.
Há
também outros casos, como o do pedreiro que em poucos dias de
liberdade, ao sair da prisão, cometeu uma série de assassinatos
contra jovens e adolescentes. Novamente se ouviu o clamor por
justiça. Ele auto se justificou, ou seja, suicidou-se. Isso alegrou
a multidão. O fato é que devemos refletir, pois estamos
retrocedendo aos primórdios, ao olho por olho e dente por dente. Já
é possível ver a justiça sendo feita por causa de um esbarrão, de
um pisão no pé, de uma fechada no trânsito e por tantas
banalidades que só afloram o sentimento de vingança. Que a justiça
cega possa abrir os olhos para enxergar o tanto de vingança que se
pratica em nome de uma justiça que se espera. E que nós, cidadãos
injustos, deixemos de praticar vingança em nome da justiça...um
erro, não justifica o outro
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