Dizem
que não se pode menosprezar a sabedoria dos idosos mesmo que sejam
completamente analfabetos porque a experiência de vida que tiveram
carregam em seu viver palavras sábias e cheias de realidade. Em
certa ocasião, em uma conversa informal com um velho senhor
septuagenário pude constatar essa verdade. Conversávamos
descontraídos
sobre alguns assuntos pessoais, sociais e familiares, quando de
repente abordamos o tema fofoca. Por mais incrível
que possa parecer, foi onde gastamos mais tempo. É um tema que
envolve, mesmo sem querer, pessoas muito próximas entre si gerando
desconfiança, intrigas, inveja e que em certos casos suscita a ira,
desamor, desavenças, vingança e até mesmo brigas por coisas tão
fúteis, sem
sentido e por total falta de compreensão e discernimento. Claro
que eu sempre soube dessas coisas e que desde que o mundo é mundo, a
fofoca está presente no nosso cotidiano. Agora, uma palavra que me
deixou perplexo ao ouvi-la, foi quando em sua simplicidade e
sabedoria de vida, afirmou sem sombra de dúvida, pelo
menos para ele, que
hoje em dia, toda a lenha que queima na fogueira da fofoca e que
propaga suas labaredas incendiando firmes relacionamentos familiares
e sociais,
reduzindo-os a cinza, provem das telenovelas. Engoli seco ao ouvir
tal afirmação, mas fiquei em silêncio
por instantes esperando a explicação para entender a razão dessa
afirmação. Pense nisso, ele me disse. Eu não sabia mais o que
dizer. Não sabia se concordava ou não com o que ouvia. Não
queria concordar e nem discordar do que ele acabara de dizer. Eu
precisava de sabedoria para assimilar tal afirmação. Ao
mesmo tempo procurei encontrar base sólida ao que ouvira. Ele
percebeu a minha perplexidade momentânea e esclareceu com uma
pergunta: você assiste novelas? Acreditei que estivesse ai a razão
de não entendê-lo.
Eu não assisto novelas, respondi. Me senti fora da realidade atual,
como um estranho no ninho, um alienígena
por não assistir a novelas. Eu também não assisto, respondeu ele
para minha alegria. Mas os trechos que eu vejo entre idas e vindas
pela casa é muito fácil perceber o conteúdo nefasto que permeia
cada episódio novelesco. As intrigas, o adultério, as meias
palavras ou recheadas de segundas intenções, as armadilhas para se
chegar e conquistar o que se não tem, tudo isso faz parte de
qualquer trama. É por isso, que as mulheres, e principalmente as
mulheres, enfatizou ele, que são assíduas seguidoras de
telenovelas, quando conversam entre si, falam daquilo que estão
cheias. A boca fala daquilo que está cheio o coração, completou. É
impossível nos encher diuturnamente com essas coisas e não falarmos
delas. As conversas hoje em dia contém sempre o nome de uma terceira
pessoa envolvida a qual torna-se o centro, a razão e o motivo do
assunto e isso tem origem nas telenovelas. Muitas pessoas não
conseguem conversar se não for sobre outra pessoa. Se tirar o nome
de terceiros da conversa o assunto se esgota em fração de minuto.
As pessoas viraram o tema principal na boca de fofoqueiros e
fofoqueiras de plantão. Há especialistas nesse assunto e a origem
de suas fofocas são principalmente atores e atrizes em suas
performances
nas novelas através de personagens vilões e circunstâncias que o
cercam no viver diário que destoa
do virtual. Refleti em segundos e vi a sabedoria popular ser expressa
através daquelas palavras. Embora não concordando completamente,
não ousei discordar. Nem todos que acompanham as telenovelas são
fofoqueiros ou fofoqueiras, pensei, sem expressar meu pensamento. No
entanto, percebi que ele não estava de todo equivocado. Embora o
sentimento que ele deixava transparecer fosse de indignação com a
perda de tempo ao assistir algo que não acrescenta nada de
importante ao ser humano, pelo contrário, fomenta ainda mais a
luxuria, a ambição, o orgulho, a inveja e consequentemente a
fofoca, cabe a cada um refrear sua língua e controlar suas palavras,
porque a morte e a vida estão sob seu poder. Conclui, sem esgotar o
assunto, que a fofoca é o leva e traz
de características,
atitudes, fatos verdadeiros ou não que ouvimos e falamos sobre
outras pessoas acrescentando ou diminuindo razões, virtudes e
qualidades de terceiros. Isso gera um círculo
gigantesco, sem começo e sem fim que serve apenas para diminuir os
seres humanos entre si. A boca fala daquilo que o coração
está cheio, pelo menos isso, segundo disse-me aquele senhor, me deu
a certeza que não sou um fofoqueiro na total concepção da palavra.
Não estou cheio de novelas, nem cheio de mim mesmo, afinal, em
um mundo global, estou
cheio de que? Terminamos
a conversa e continuo pensando...
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