quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Velho ou idoso?

Justo na minha vez pensei. Inclinei-me em um gesto de cortesia e estendi-lhe a mão concedendo-lhe a primazia no atendimento. Ela sorriu, aliás, era algo forte e marcante em seu rosto. Obrigada, respondeu-me sorrindo. Em passos lentos, (para a minha idade, mas normalíssimo para a dela) se esforçou para chegar até o caixa. Vestida elegantemente com um longo vestido florido, uma grande bolsa preta pendurada no braço, ainda reluzindo o brilho do verniz, no rosto óculos grandes e escuros, um chapéu inclinado que permitia visualizar um caprichado penteado, e uma forte maquiagem que não a deixava esconder o tempo que havia passado. Trazia pendurado ao pescoço um enorme colar que parecia de pérolas (se era bijuteria ou joia) eu não sabia precisar.
No braço esquerdo além da grande bolsa preta, um belo relógio e anéis enormes complementavam o visual. As unhas bem pintadas de um vermelho escarlate facilmente se podiam notar. Era uma dama, ou melhor, uma lady. Cumprimentou alguns dos atendentes pelo nome, encostou a bengala no balcão, tirou pacientemente alguns documentos de dentro da bolsa envoltos em um saco plástico e os deu ao caixa. As pessoas atrás de mim iniciaram um burburinho, virei-me e percebi que falavam dela. Mas como tem velho fazendo o papel de office boy, ainda pude ouvir. Quase fui traído por um pensamento maldoso, mas sacudi a cabeça com o intuito de desviar de mim tal pensamento. Comecei a pensar sobre aquela famosa lei, a de Murphy, e até lembrei-me de uma, a que diz que a fila do lado sempre anda mais rápida. E a fila dos idosos estava bem mais rápida, mas ela foi atendida na minha fila e na minha vez. Preferi não pensar nessa lei de Murphy e sim naquela dama (lady) Murphy elegante que permiti ser atendida na minha frente.
Os comentários maldosos falavam sobre os velhos como se fossem algo descartável, que se usa e depois se joga fora por inutilidade. O velho, no caso, aquela senhora idosa, digo aquela lady, estava sendo alvo, sorrateiramente, de falatórios vãos. Ela, que poderia com toda a certeza, ser mãe ou avó de alguns que estavam ali na fila, sem saber, estava sendo criticada como se fosse um objeto usado, velho e imprestável e não como um ser humano cheio de experiência e digna de todo respeito e amor. Uma pessoa idosa virou sinônimo de coisa velha, que todos querem jogar fora, ou arrumar um cantinho para se colocar e esquecer. Ela apesar de seu corpo parecer não corresponder com a mesma rapidez os apelos de sua mente, mesmo assim, sentia-se útil e isso, para ela, era o que mais importava. Podia se ver pelo seu semblante radioso.
A alegria de ainda poder servir era notória. Enquanto a observava, meus pensamentos me mostraram que possivelmente muitos daqueles que faziam tais comentários, jamais pudessem alcançar a sua idade. Ou quem sabe, não tenham pessoas idosas em suas famílias, ou se tem, consideram-nas como velhos, alguém que só atrapalha o bom andamento das coisas. Ser velho, nessa sociedade moderna parece ser sinal de retrocesso, de empecilho, de transtorno. O idoso passou a ser alguém sem valor, mesmo com tanta sabedoria de vida, ainda é considerado incapaz para muitas pessoas. Lembrei-me dos meus velhos. O mesmo caminhar em passos lentos, o sorriso contagiante, joias raras que Deus para si os chamou. Projetei-me nela mais uns vinte ou vinte e cinco anos talvez, quem sabe trinta ou mais, sorri para mim mesmo, mas, não gostaria de ser considerado velho no sentido de imprestável, inútil, empecilho ou coisa do tipo, mas, de alguém que aplainou a estrada para que os mais jovens pudessem caminhar por ela.

O meu desejo foi virar-me e perguntar aos que faziam tais comentários: no futuro, vocês gostariam de ser considerados velhos ou idosos? Mas me contive...

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