sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Não falo, não ouço e não vejo

Acredito que todo mundo conhece, ou pelo menos já viu, a figura daqueles três macaquinhos, um com as mãos nos ouvidos, outro com as mãos nos olhos e ainda o outro com as mãos na boca. Segundo o folclore japonês um chama-se “Mizaru” (o que cobre os olhos) o outro “Iwazaru” (o que fecha a boca) e o terceiro (o que tampa os ouvidos) “Kikazaru” e segundo essa mesma lenda japonesa significa, “não veja o mal, não fale o mal, não ouça o mal” não sei a ordem correta, a ordem é o que menos importa. O que importa e bom seria é que o mal e suas formas jamais fosse expressado.Na rua, na chuva, na fazenda e em São Paulo
Muitas coisas em nosso viver, são como a figura desses três macaquinhos, não sabemos o verdadeiro significado, mas falamos, ouvimos e vemos e nos envolvemos com elas sem saber o seu real sentido. Não ouvir o mal. Nossos ouvidos parecem que têm comichões, são ávidos por fofocas e notícias fabricadas sem base e sem procedências confiáveis, sem verdade e sem nenhuma utilidade. Ouvimos promessas vazias de políticos mentirosos, ouvimos músicas banais e sem nenhum conteúdo, ouvimos falar de guerras, terremotos, fome, morte, tempestades, e tantos outros fenômenos naturais devido a natureza descontrolada. Ouvimos sobre tudo o que não gostaríamos de ouvir mas ouvimos.
Ouvimos o som da cidade, sirenes de ambulâncias, de tiros, vemos o corre-corre desesperado nas ruas, ouvimos o grito dos inocentes, ouvimos e vemos algumas mães desesperadas chorando por seus filhos. Ouvimos gritos de dores de pessoas em hospitais sem assistência. Ouvimos o clamor de um pedinte por esmolas, das crianças os sonhos contidos por falta de escolas. Queria poder cerrar meus ouvidos e meus olhos a esses males, à calúnia, à inveja, à hipocrisia, ao fingimento, ao desprezo, a dor, ao medo, ao abandono, mas é o que mais vemos e ouvimos.
Vemos, ouvimos e falamos até em demasia, sobre violência, sobre roubos e assaltos, sobre a corrupção desenfreada em todos os segmentos da sociedade. Vemos menores infratores, e nesses últimos dias, infelizmente, a bola da vez é a pedofilia e a pederastia que parecem fora de controle. Vemos religiosos como padres, monges, caciques, rabinos, pastores e tantos outros homens aparentemente cheios de moral e integridade, que deveriam ser modelos para seus grupos e seus rebanhos, estão sendo modelos de vergonha não apenas para eles, mas para toda a sociedade.
Vemos e ouvimos pessoas imbuídas de autoridade, que deveriam praticar o bem e promover a justiça acima de tudo, serem as primeiras a desonrá-la. Aliás, justiça é o clamor do povo que mais ouvimos pelas ruas. Mas onde há justiça? Os dias são maus. O mundo é só maldade. Damos valor ao que não tem valor. Seria bom se pudéssemos ouvir e ver as coisas boas da vida, como as correntezas caudalosas dos rios, os cantos dos pássaros na natureza, o nascente e poente do sol nas tardes avermelhadas e sem poluição, como seria bom, mesmo em cidades grandes, ver as estrelas no céu, o arco-íris após a chuva de verão, ver as flores nos quintais e viver cada dia o seu momento.
Queria ver a inocência, a pureza e o sorriso, coisas naturais das crianças acompanhando-as até a fase adulta. Queria ouvir uma conversa sem malícia e sem segundas intenções. Não ouço mais aquele bom dia sincero, como antigamente, que vinha sempre acompanhado de um sorriso espontâneo. Não vejo mais a educação, os bons costumes a gentileza, a cordialidade, a humildade e a sinceridade. A aparência tomou conta do nosso ser. Queria não ver mais as desigualdades sociais e nem ouvir falar sobre racismo, falta de saúde, imoralidades, e tantas outras falcatruas do gênero humano.
Quem dera pudéssemos ouvir o clamor silencioso das pessoas que sofrem angustiadas, solitárias, com depressão, ansiedades, pânico. Quem dera ouvíssemos o grito interior dos filhos clamando por ajuda para se libertarem das drogas. Acho que é possível haver mais liberdade e menos libertinagem, mais palavras de incentivo, de encorajamento e menos chalaças (gracejos pesados), menos parvoíces, mais risos, menos rancores, menos tédio, mais prazer. Prazer de estar com a família, de poder abraçar um filho e agradecer a Deus por sua saúde e perfeição. Não queria ver mais os jovens deitados pelas calçadas sem perspectiva de vida, sem sonhos, sem ideais, dopados para afugentarem a fome e passamos por eles, sem nenhum sentimento interior, como se nada tivéssemos com isso.
Como gostaria de não ver mais, nem falar ou ouvir sobre a brutalidade e o instinto selvagem que vem tomando conta dos seres humanos, especialmente dos jovens. A raiva, o sentimento violento de ódio, vem explodindo os corações dos homens desde a mais tenra idade, como um vulcão expelindo suas lavas, atingindo com grande destruição tudo ao redor. É algo incontrolável um ser humano cheio desse sentimento. Isso é a pura personificação do mal. É o homem dando formas ao mal, tornando-se maligno.
Queria poder falar mais sobre o amor de Deus, esse amor singular, único, que mesmo se todos os poetas fossem escrivães fiéis, com palavras humanas, seriam incapazes de descrever esse amor em todo o seu fulgor. Que possamos abrir nossa boca para mais agradecer do que lamentar, que respostas brandas desviem o furor, que não haja maldizente, que cesse toda a contenda e que o coração alegre formoseie o rosto de todos. É melhor sorrir do que viver iracundo.
Espero confiantemente que a oração do Mestre-dos-mestres se cumpra em cada ser humano:
livrai-os do mal. Que esses três macaquinhos, que insistem em ficar com olhos, boca e ouvidos tampados, para não contemplarem a maldade e suas facetas, possam um dia, quem sabe, baixar suas mãos e se alegrarem com o que se veem, se ouvem e se falam entre os humanos, o amor, e esse, em seu mais abrangente sentido. E que a paz verdadeira, tanto exterior quanto interior, a harmonia e o equilíbrio entre o homem e a natureza, andem de mãos dadas. E que sentimento nenhum seja poluído pela falta de amor. Que a justiça não seja para os injustos, mas uma virtude de todos. Espero não estar sonhando sonhos impossíveis, mais ainda quero ter olhos para ver a maldade desaparecer e o amor, ser eterno novamente...

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